segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Espanha x Maconha = A Espanha que faz a cabeça

Fonte: Carta de Barcelona - Globo.com

"Diz a lenda que, na Espanha, cada pessoa adulta pode ter em casa, sem perigo de ser presa, dois vasos de “cannabis”, planta cujas flores são consumidas na forma de “porros”, cigarrinhos feitos à mão com ou sem mistura de tabaco.

É apenas uma lenda, mas amplamente apoiada na realidade. A legislação espanhola não considera crime o uso da maconha, seja para fins lúdicos ou medicinais, enquadrando como tal apenas o tráfico da droga e seu consumo em espaços públicos.

A omissão da lei sobre o cultivo doméstico para consumo pessoal é interpretada como permissão por centenas de milhares de espanhóis que ostentam as mais viçosas folhagens em suas varandas. E os tribunais vem confirmando esta leitura.

Multiplicam-se as publicações sobre a planta, seus derivados, utensílios e formas de cultivo; as lojas que vendem desde produtos de cânhamo a uma infinidade de apetrechos para o consumo; as associações de usuários e o cultivo comunitário.

A naturalidade com que o espanhol convive com a “marihuana” é sinal do amadurecimento do debate sobre o tema, que vai muito além da liberação do uso da droga em “coffee shops” como os holandeses.

Um dos principais eixos de discussão, amparado em pesquisas científicas de instituições de renome, é o uso medicinal da planta e/ou de seu extrato, já regulamentado em países como Alemanha, Noruega, Reino Unido, Áustria e Itália.

Lembro que há medicamentos produzidos em laboratório com o princípio ativo da “cannabis” (o THC) cujo uso é autorizado na Comunidade Européia por tratados farmacológicos internacionais. São específicos para sintomas relacionados à AIDS e à quimioterapia de combate ao câncer.

Mas é bem maior a lista de doenças que poderiam ser tratadas com o uso da maconha, a depender da continuidade das pesquisas e da liberação do uso: náuseas, vômitos, anorexia, esclerose múltipla, epilepsia, depressão, dores, glaucoma e até asma.

A regulamentação deste e de outros usos da “marihuana” é a principal bandeira do chamado “Partido da Cannabis”, a Representação Cannábica de Navarra (RCN), sediada em Pamplona, norte da Espanha.

A RCN inaugurou esta semana a primeira sede européia dedicada à experimentação dos usos lúdico e medicinal da maconha.

O programa do partido é no mínimo instigante. Defende, por exemplo, a regionalização do cultivo da maconha – com certificação de origem controlada! - para combater o tráfico, aumentar a arrecadação de impostos e gerar empregos.

Propõe o uso industrial da planta nos mais diversos setores; o ensino nas escolas sobre prevenção ao uso de drogas; a descriminalização do uso de qualquer substância por pessoas adultas.

Tudo sob o controle de uma espécie de agência reguladora da maconha – o Conselho Regulador e Controlador da Cannabis.

O que chama a atenção é a quase total ausência de tabu do espanhol comum para lidar com o assunto.

Talvez a História já os tenha libertado de algumas camadas de hipocrisia, afinal o ser humano convive com a “cannabis” desde o terceiro milênio antes de Cristo, e só nos últimos dois séculos é que isso passou a ser considerado crime.

E não há nada mais pragmático quando se quer enfrentar um problema que encará-lo como ele realmente é, sem as lentes distorcidas do preconceito.

Exemplo que tem sido seguido pelos norteamericanos. Esta semana, o estado de Nova Jersey foi o décimo-quarto a aprovar legislação sobre o uso médico da “marihuana”, e a Suprema Corte da Califórnia eliminou, por unanimidade, os limites para cultivo e porte de “cannabis” para os mesmos fins.

Antes que me atirem pedras, recomendo aos interessados uma visita ao site http://www.cannabis-med.org . Porque, mesmo atrasado, o Brasil não poderá fingir que esse debate não está acontecendo. E é melhor estarmos bem informados."

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